Segundo o último estudo da MainStreet Partners — no qual foram analisados mais de 7.000 fundos — aproximadamente 1.800, ou seja, 25%, utilizam terminologia afetada pelas novas normas da ESMA. Isso representa um grande desafio para os gestores, mas também para os investidores. Sobre isso conversamos com José María Gallardo Varo, diretor da MainStreet Partners, nesta entrevista.
Segundo o seu estudo, até 25% dos fundos ESG terão que mudar de nome após a nova regulamentação da ESMA, não é muito? Qual a sua avaliação sobre esse número?
De fato, 25% é uma porcentagem considerável, mas não necessariamente surpreendente. A nova regulamentação da ESMA estabeleceu critérios muito mais rigorosos para o uso de termos relacionados à sustentabilidade no nome dos fundos, o que reflete uma intenção clara de proteger o investidor de um potencial risco de greenwashing.
Na minha opinião, trata-se de um ajuste útil para garantir que os fundos apresentados como ESG ou sustentáveis realmente atendam aos padrões de sustentabilidade. Vemos isso como um passo positivo no que diz respeito a fornecer maior transparência ao setor.
Por que os fundos mais afetados por essa mudança são os do artigo 8?
Os fundos do artigo 8 sob o SFDR (Regulamento de Divulgação de Sustentabilidade no Setor de Serviços Financeiros) são projetados para promover características ambientais e sociais, mas não têm a obrigação de cumprir o mesmo nível de investimento sustentável que os fundos do artigo 9, que têm objetivos de sustentabilidade estabelecidos, mensuráveis e claros. De fato, referindo-nos a outro estudo realizado pela MainStreet Partners, descobrimos que aproximadamente 23% dos fundos classificados como sustentáveis que analisamos (que em sua maioria são do artigo 8) estão expostos a um potencial risco de greenwashing. As novas diretrizes da ESMA exigem maior clareza e rigor quanto às características sustentáveis que estão sendo promovidas, razão pela qual os fundos do artigo 8 existentes serão, em consequência, os mais afetados.
Na sua opinião, qual parte é a mais complexa das mudanças feitas pela ESMA? Pode ser a parte das exclusões?
Uma das áreas mais desafiadoras, sem dúvida, é a relacionada às exclusões. A ESMA tem enfatizado a necessidade de garantir que os fundos que utilizam em seus nomes terminologia relativa a aspectos sustentáveis excluam setores que não estejam alinhados com o Acordo de Paris. Na prática, isso implica não investir, por exemplo, em empresas dedicadas ao cultivo e produção de tabaco, em empresas com 10% ou mais de seus lucros oriundos de atividades relacionadas a combustíveis fósseis ou em empresas que não cumpram com o Pacto Global da ONU ou os Princípios da OCDE. Gerenciar esses requisitos de exclusões pode ser um desafio para muitos gestores, por isso, ter dados robustos, atualizados e de qualidade é fundamental. Do ponto de vista reputacional, os fundos classificados como sustentáveis que não se ajustarem adequadamente às novas normas da ESMA e, portanto, se expuserem a um risco potencial de greenwashing, podem enfrentar uma perda de confiança por parte dos investidores. Por outro lado, aqueles gestores que se adaptarem com sucesso e demonstrarem um forte compromisso com a transparência em relação ao investimento sustentável podem ver uma melhora em sua reputação a médio e longo prazo.
Você acredita que para cumprir a regulamentação haverá fusões entre fundos ou até mesmo o desaparecimento de alguns deles?
É provável que continuemos a ver fusões de fundos sustentáveis, especialmente entre aqueles que não conseguem atender aos requisitos de forma independente, e essa consolidação do mercado será uma forma eficaz de otimizar carteiras e cumprir os novos limites de sustentabilidade. Em alguns casos, os fundos que não forem viáveis sob a nova regulamentação poderão ser obrigados a desaparecer ou a reorientar completamente sua estratégia de investimento.
De fato, segundo um estudo recente, até o momento deste ano, 379 fundos sustentáveis foram fusões ou foram fechados. No entanto, isso não é necessariamente uma medida negativa, pois ajudará a depurar o mercado de produtos que não atendem aos padrões de sustentabilidade esperados.
Essa regulamentação pode reduzir a oferta de fundos sustentáveis?
É possível que, a curto prazo, vejamos uma redução na oferta de fundos sustentáveis existentes devido aos requisitos mais rigorosos, mas não acredito que isso seja uma tendência permanente, pois, à medida que os gestores se adaptarem às novas regulamentações, veremos uma reconfiguração dos fundos sustentáveis disponíveis, com maior clareza e rigor. Isso, a longo prazo, será positivo para o setor de investimentos sustentáveis, pois os fundos que se mantiverem ou forem lançados sob essas novas normas serão mais robustos e transparentes no que diz respeito à sustentabilidade.
Em relação ao cumprimento dos 80% de investimentos sustentáveis, podemos esperar mudanças consideráveis nas carteiras dos fundos?
Como comentamos anteriormente, segundo um estudo realizado pela MainStreet Partners, embora a quantidade atual de fundos afetados, tanto em termos de nomenclatura quanto de exclusões, seja relevante, o percentual de ativos sob gestão impactados é relativamente baixo. Entendemos que, o mais provável, é que os gestores desses fundos afetados busquem liquidar suas participações nas empresas que não atendem às exclusões; no entanto, uma quantidade reduzida de gestores optaria por mudar o nome dos seus fundos afetados.
Você considera viável que os fundos cumpram a nova regulamentação no prazo estipulado? Acha que haverá algum tipo de prorrogação para os fundos que não conseguirem cumprir o prazo?
Em relação aos prazos, os fundos existentes antes de 21 de novembro deste ano terão até 21 de maio de 2025 para se adaptar às novas regulamentações, enquanto os fundos criados após 21 de novembro de 2024 deverão fazê-lo imediatamente. Esses prazos são ambiciosos, mas possíveis de serem cumpridos para os fundos que já possuem uma estrutura ESG robusta. As datas foram confirmadas em agosto deste ano e, atualmente, não há indicações de que haverá uma prorrogação para a implementação.
Você considera que essa regulamentação da ESMA é eficiente para evitar o greenwashing em relação ao investidor?
Essas novas diretrizes da ESMA são, sem dúvida, um passo à frente na luta contra o greenwashing, pois, ao aumentar os requisitos e a transparência, exigem que os gestores de fundos forneçam uma definição mais clara e consistente de suas estratégias de investimento sustentável, o que melhora a proteção dos investidores.
No entanto, embora seja um passo importante, uma regulamentação por si só não resolverá o problema do risco de greenwashing; será crucial um esforço conjunto de todos os agentes do mercado para alcançar esse objetivo.