Para um investidor latino-americano, pode parecer desnecessário investir em pequenas e médias empresas europeias, especialmente no setor de inovação, dada a grande variedade e os casos de sucesso que têm surgido no mercado norte-americano na última década, ou em mercados locais, como o brasileiro.
Dorian Terral, analista/gerente de portfólio e um dos sócios fundadores da Lonvia Capital, explica em entrevista à Funds Society que na Europa também há oportunidades e empresas de ponta em tecnologia. Esse setor abrange, incluindo a tecnologia médica, cerca de 65% das empresas em que a estratégia de small e mid caps da gestora francesa investe.
“Uma indústria em que a Europa lidera em inovação tecnológica é a de equipamentos médicos”, explica Terral. Os países nórdicos são referência nesse setor, com um grupo de especialistas que gerou empresas muito bem-sucedidas, tanto no private equity quanto nos mercados públicos.
Como exemplo de inovação nessa área, Dorian Terral destaca o setor de transplantes. “Sabia que os 160.000 transplantes de órgãos realizados anualmente nos países desenvolvidos representam apenas 10% da demanda? Os outros 90% não acontecem, não tanto pela escassez de doadores, mas pela impossibilidade de fazer o órgão chegar à mesa de operações a tempo.”
A empresa sueca XVIVO, fundada em 1998, desenvolveu uma tecnologia que permite triplicar o tempo de vida de um órgão após a morte do doador. “No caso dos pulmões, apenas 20% dos órgãos doados são usados; 80% são perdidos. No caso do coração, a taxa é de 30% de utilização e 70% de perda. A oportunidade de mercado é significativa, como demonstra o crescimento anual entre 50% e 60% que a XVIVO tem experimentado nos últimos três anos”, explica o gerente de portfólio.
Alguns investidores são reticentes em relação a esse tipo de estratégia, pois os fundos de small e mid caps às vezes são obrigados a retirar do portfólio suas histórias de sucesso: empresas que compraram quando eram pequenas, mas que cresceram e se tornaram large caps ao se destacarem em seus mercados. “Na Lonvia, não nos obrigamos a vender uma empresa por causa de sua capitalização de mercado. Um exemplo disso é a companhia alemã de software para arquitetos Nemetschek, que está nos portfólios de Cyrille há 16 anos e agora tem uma capitalização de mercado que supera 12 bilhões de euros, já não sendo considerada tão pequena segundo os padrões europeus”; contudo, Dorian Terral ressalta que nunca ingressa no portfólio uma nova empresa de grande capitalização.
Cyrille Carrière, mencionado por Dorian, gerencia as estratégias LONVIA Mid Cap Euro e LONVIA Mid Cap Europe, além de ser CIO e co-fundador da gestora. Dorian Terral, assim como Cyrille, começou sua carreira como analista financeiro. No caso dele, ao iniciar sua trajetória, escolheu o setor de semicondutores, que cobriu de 2012 a 2018. “Naquela época, não era o setor mais interessante, mas eu gostava muito de hardware. Programo desde os oito anos e, por isso, já tinha um grande conhecimento dessa área técnica; as oportunidades de investimento eram evidentes para mim.”
Quando Dorian começou a analisar as empresas de semicondutores, havia poucos analistas na Europa que realmente entendiam o setor. Existiam empresas muito inovadoras, embora poucos as compreendessem. Dorian conseguiu detalhar o setor e ganhou o prêmio de melhor analista de tecnologia na Europa pela Refinitiv (antiga Thomson Reuters) em 2018.
Considerando essas credenciais, prestamos atenção aos seus comentários sobre as grandes oportunidades e desafios do setor atualmente: a maior oportunidade é a inteligência artificial, sobre a qual Dorian Terral alerta que “não é uma moda” e que “vai mudar como fazemos tudo, mas não vai nos substituir”; o maior desafio é a cibersegurança, já que a inteligência artificial nas mãos de hackers pode se tornar o pior pesadelo das empresas e dos governos. A outra grande oportunidade é a digitalização industrial e todas as tecnologias relacionadas à mudança climática.