A baixa alocação dos investidores brasileiros em ativos do exterior é um tema de discussão constante entre players do mercado.
Muito além da taxa de juros, que reforça o apetite local pela renda fixa, as razões são muitas, envolvendo inclusive o próprio lado da oferta, com assessores e gestores ainda pouco qualificados no entendimento sobre as oportunidades offshore, e um reforço negativo a cada vez que a performance dos investimentos é comparada ao CDI, na opinião de Cesar Chicayban, CEO do XP Private Bank,
“O Brasil é o único país que mede seu resultado de investimento como percentual de sua taxa básica de juros”, disse o executivo, durante o evento ‘Global Insights’, promovido pela Anbima na última quarta-feira (1).
Realizado às vésperas do aniversário de um ano da entrada em vigor das regras da Resolução 175 da CVM (Comissão de Valores Mobiliários) —que trouxe, justamente, um pouco mais de abertura à atuação de gestoras estrangeiras no Brasil —, o evento discutiu tendências, oportunidades offshore, além das causas da baixa alocação no exterior.
“A gente não encontra essa dinâmica fora do Brasil. No exterior, é apenas ‘retorno absoluto'”, critica o CEO. Ele afirma que fora do país há uma oferta “infinita” de ativos ilíquidos, que podem ser a melhor escolha para os investidores.
“Tradicionalmente, se bem alocados, tem uma assimetria de retorno com ativos líquidos, portanto, te dando chances de ter uma bela geração de alpha, num portfólio construído para o longo prazo”, diz.
Educação de gestores e assessores é fundamental, diz CEO
Segundo Chicayban, um dos obstáculos locais envolve a educação do lado da oferta: assessores e gestores com entendimento aprofundado sobre investimentos no exterior.
“O profissional precisa de formar adequadamente para se tornar um gestor patrimonial profissional global. Ainda existem poucas de educação financeira, de formação e de certificações para isso no Brasil”, diz o CEO. Ele afirma que fora do país há uma ampla gama de cursos e provas internacionais, voltadas para os ativos offshore.
Ele diz que houve um grande trabalho na educação do investidor, com democratização de acesso e informação, mas que isso ainda não ocorreu com o lado dos gestores. “Parte do desafio começa no banqueiro, no assessor, pois ele tem uma oportunidade de apontar os caminhos”, diz.
“Boa parte dos investidores com quem conversei ao longo da minha carreira, querem ter um aconselhamento sem viés. O que percebo muito hoje, é um viés local: quem tem uma plataforma local quer defender seus ativos e naturalmente não vai favorecer uma alocação internacional”, afirma Chicayban.
Segundo ele, há um viés diametralmente oposto a quem oferece apenas ativos no exterior, sempre favorecendo uma alocação offshore. “Olhando para frente, acho que esse vai ser o grande desafio: criar um modelo integrado, de fácil intercomunicação, com aconselhamento para o cliente final, sem viés, com isenção e plataformas cada vez mais completas”.
‘Investidores internacionais do Brasil buscam bonds brasileiros’
Chicayban diz que vê uma ironia entre os clientes private: mesmo quando boa parte desses investidores procuram a diversificação, olham sempre para bonds de emissores brasileiros no exterior.
“Qual é o sentido de você buscar um bond de um emissor que está disponível no Brasil? (…) No fim do dia você está deixando bastante dinheiro na mesa, com a oportunidade de acessar grandes teses, grandes companhias e ativos ilíquidos que não estão disponíveis no Brasil”, diz.
‘Portfólios semelhantes a endowments’
Chicayban afirma que ao usar ativos do exterior, o investidor pode construir carteiras robustas como endowments, fundos cujo objetivo é gerar rendimentos para financiar atividades específicas, como fazem grandes entidades filantrópicas.
O CEO explica que os family offices estão indo para o mesmo caminho, construindo portfólios sólidos, e diz que um bom exemplo histórico de uso desses recursos vem das universidades dos EUA. “A universidade americana consome de 30% a 50% com recursos vindos de seus endowments”, diz.
“Esses investimentos são feitos para durar a vida toda”, completa.