Diante da expectativa de queda nos juros no longo prazo; uma readequação das carteiras do fundos de pensão; além da possível recuperação da economia chinesa no horizonte, Werner Roger, sócio-fundador da Trígono Capital, vê o mercado de ações brasileiro em um ponto de inflexão.
Em conversa com a Funds Society, o gestor destaca que, embora o cenário atual ainda exija cautela, com juros altos pressionando o mercado, os investidores estrangeiros já começam a observar oportunidades estratégicas.
A aposta é que, com a diminuição das incertezas econômicas e políticas, o Brasil poderá se tornar um dos grandes focos de investimento no cenário global, especialmente pela sua posição única no G20 e forte vínculo com a demanda asiática.
Além disso, os fundos de pensão —cujas carteiras a Trígono marca presença—, com seus trilhões de reais administrados, começam a entrar na mira das gestoras, a fim de adequar suas carteiras para um futuro cada vez mais próximo, em tese, com juros menores.
A gestora tem, atualmente, R$ 2,5 bilhões sob gestão, dos quais metade está distribuído nas plataformas digitais, e a outra parte entre investidores institucionais, como EFPCs (Entidades Fechadas de Previdência Complementar) e RPPS (Regimes Próprios de Previdência Complementar).
Uma outra parte relevante dos institucionais está também nos Fundos de Fundos, que passaram a engordar o AUM da Trígono após a parceria com a BB Asset, gestora do Banco do Brasil e a maior do país, realizada há pouco mais de um ano.
Demanda por empresas defensivas aumenta
Segundo Roger, o que o mercado tem observado nos últimos três anos é a necessidade de investir de maneira defensiva.
“O que subiu nesse período foi o IDIV [índice de dividendos], que está 53% construído com base em setores financeiros — bancos como Itaú e Bradesco — e concessionárias que têm tarifas garantidas e pouca variação com o PIB, como energia, saneamento, telecomunicações e logística”, diz o gestor.
Ele cita que outro fator relevante que tem gerado demanda por esse setor, é o câmbio. “O dólar afeta diretamente empresas como Vale, Petrobrás e Suzano. E essas empresas têm sido beneficiadas”, diz, citando também o cenário de alta nas commodities como um alicerce dessas companhia.
E por último, o principal: os juros. “Setores defensivos, o câmbio e as small caps explicam muito do movimento da bolsa. As empresas maiores, mais líquidas, estão sendo preferidas pelos investidores que querem evitar exposição a juros”, diz o gestor.
Fundos de Pensão e ações de longo prazo
Roger também comentou sobre o impacto do sistema de previdência complementar na bolsa. “Os fundos de pensão estão cada vez mais pressionados a garantir o pagamento das aposentadorias com o retorno das carteiras de investimento”, aponta o gestor.
Ele afirma que, com os novos planos de contribuição definida, os pagamentos dependem diretamente do desempenho das carteiras. “Se os juros caírem, esses planos terão que aumentar sua exposição em ações para garantir o retorno necessário para as aposentadorias futuras”, explica.
“Se essa carteira não render o suficiente, o fundo de pensão terá que cobrir o déficit. Isso significa que, eventualmente, a patrocinadora do fundo terá que colocar mais recursos para garantir o pagamento dos aposentados. Se a carteira de investimentos não der o retorno esperado, o aposentado pode ter que contribuir mais, ou a empresa precisará arcar com a diferença”, diz.
Para Roger, os fundos de pensão serão forçados a investir mais em renda variável à medida que os juros caem, o que aumentará a importância de gestores qualificados para garantir o retorno no longo prazo.
“Hoje, esses fundos têm, em média, 8% de exposição em renda variável, mas já foi 25% no passado. A tendência é que essa participação aumente novamente”, conclui.
Emergentes na mira dos estrangeiros
À medida que os juros caem em outros países, como no caso dos EUA, o apetite por risco entre investidores aumenta, especialmente nos mercados emergentes como o Brasil.
“Os estrangeiros, com uma visão de longo prazo, já começam a se posicionar para a queda dos juros no Brasil. O PIB está crescendo, mesmo com juros elevados, o que é um bom sinal. Eles olham para as grandes empresas brasileiras, como Petrobrás e Vale, comparando-as com similares globais, e percebem que estão baratas”, avalia, colocando que os mercados emergentes já podem começar a ser beneficiados por bolsos estrangeiros.
“Já o investidor local ainda está cauteloso, aguardando uma confirmação mais clara da queda dos juros”, diz. “No G20, o Brasil é a sexta economia que mais cresce, empatada com a Turquia”, afirma Roger. Isso, segundo ele, coloca o país no radar dos investidores internacionais, que começam a analisar setores que podem se beneficiar com a futura queda dos juros, como os small caps. “Esse setor é mais sensível à queda dos juros”, diz.
China pode ser surpresa positiva
Outro fator importante para o Brasil, segundo Roger, é a relação com a China.
O país asiático é o maior parceiro comercial do Brasil, especialmente em commodities e alimentos. “Se a China anunciar um pacote de estímulos econômicos, o Brasil será diretamente beneficiado”, afirma. Para ele, investir no Brasil pode ser uma forma indireta de estar exposto à recuperação da economia chinesa.
Setores como mineração, com destaque para Vale e Petrobras, e a indústria de alimentos e proteínas, seriam grandes beneficiados por um eventual crescimento da demanda chinesa. “Se a China deixar de exportar aço, por exemplo, empresas como Usiminas e outras do setor siderúrgico poderão se valorizar significativamente”, diz Roger.